sexta-feira, 4 de março de 2016

Repete, por favor, porque não entendi.

Texto de reflexão apresentado após 8ª aula da disciplina SEMINÁRIO DE EDUCAÇÃO BRASILEIRA em Outubro de 2012. Profª. Dra. Maria Juraci Maia Cavalcante. Autora: Carolina Maria Costa Bernardo.


Quando entrei em sala fui surpreendida com a presença de um músico convidado que estava dizendo a seguinte frase: o samba é europeu. Continuou explicando sobre o conceito de Tonal para justificar a absurda informação e em seguida compartilhou os conflitos que vivenciou na música quando decidiu estudar um instrumento genuinamente europeu. E concluiu: não devemos nos envergonhar quando queremos assumir nossa europeização.
Confesso que demorei a entender a lógica daquele discurso e onde, de fato, o músico queria chegar. Sabrina Linhares, nossa colega de turma, que estava se apresentando com ele fez algumas perguntas na continuidade que ajudaram a compreender melhor a razão da defesa surreal da origem eurocêntrica de alguns instrumentos, sons e estilos. Qual a origem das coisas? Quem copiou quem? Qual a origem do tambor e do pífano? Em seu texto apresentado nesta aula Sabrina afirma:

“Nossas raízes musicais foram formadas pelos apitos, chocalhos e tambores indígenas, pelas flautas e clarinetas jesuíticas, pelos pífaros e rabecas que nasceram das mãos nativas que admiraram as flautas transversas e violinos dos colonizadores, pelos pianos e acordeons dos mais abastados, pelos coros sagrado e profanos, pelos metais do sopro das bandas familiares comunitárias, pelos trios de ‘arrastapé’ (sanfona, zabumba e triangulo), pelos violões e pandeiros populares, pelos tambores dos escravos no trabalho e libertos na música.”

Considero relevante a tese que as culturas se interligam e que há muitas dúvidas sobre a origem genuína de muitos aspectos da história universal. Nessa lógica, se não podemos afirmar a origem africana e indígena porque podemos afirmar a origem européia? Por que na citação acima não estão citadas as contribuições dos instrumentos ligados a áfrica? Ou será que a referência ao negro se faz na citação escravos no trabalho e libertos na música”. Por que diante de tantos predicados positivos ligados aos sujeitos de nossas raízes na citação acima o adjetivo escravo tem que estar ligado aos negros? Não será esse um exemplo da ideologização que tantos discutimos em sala? Será que a universidade ainda não entendeu que escravização é uma condição social imposta e não uma condição natural dos negros africanos?
Enquanto universidades do mundo questionam e problematizam a imposição de uma ciência eurocêntrica o Brasil insisti em afirmar as mentiras contadas e recontadas e se nega a desenvolver uma postura crítica frente a esta ciência e ideologia nos campus assim como se nega a reconhecer como ciência as diferentes formas em outras culturas de se fazer conhecimento.
A questão não é negar nossa europeização. Tampouco hipervalorizar apenas as raízes indígenas e africanas em nossa formação. A questão é denunciar a forma como os europeus se apropriaram do patrimônio histórico cultural de nações como a África, Ásia e América. A questão é reescrever nossa história e a do restante da humanidade que foi contada a partir de um viés ideológico. Não se pode simplesmente continuar acreditando na excepcionalidade européia no tocante a criação dos valores como a democracia, a liberdade, a igualdade de direitos, bem como os conceitos civilizatórios de instituições como a família, a escola, o estado, a universidades. Não podemos continuar endossando uma superioridade cultural e ignorando as realizações de outras formas de sociedades, que também desenvolveram estes conceitos como ilustrou a professora citando Jack Goody e o livro O Roubo de Nossa História.
Concordo com Sabrina Linhares quando esta afirma que precisamos saber de onde viemos para saber para onde vamos. Essa é a questão, esse é nosso grande desafio. Buscar a ancestralidade como herança cultural, nossa identidade histórica. E para isso é preciso desorganizar as coisas que a gente já sabe e deixar de acreditar em tudo que foi escrito como obediência. 

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